Deixe-me ser mulher: Lições à minha filha sobre o significado de feminilidade 37
- Emperolar

- 28 de set. de 2022
- 3 min de leitura
37 | A HUMILDADE DA CERIMÔNIA
Americanos têm nostalgia de cerimônias. A democracia nos dá poucas chances de pompa e nenhuma de esplendor, mas você está experimentando um pouco dessas coisas na Inglaterra. Em sua carta de ontem, você mencionou ter assistido à Parada de Aniversário da Rainha. “Oh, quanta realeza, quanta majestade!”, você escreveu. “Todos aqueles guardas, a banda e a cavalaria. As cores e os trajes eram magníficos. A rainha-mãe veio na frente, em uma carruagem. Devemos ter ficado em pé por três horas. A multidão empurrava e se espremia. Se é empolgante ver a rainha, imagine como será ver Cristo, o Rei!” A Bíblia trata com naturalidade o patriarcado e a monarquia. É compreensível que essas noções apelem fortemente à imaginação daqueles que cresceram com a Bíblia. Também é natural que alguns questionem se essas são noções puramente culturais e políticas — e, portanto, puramente temporais — ou se há algo nelas que diz respeito à realidade eterna. Seriam a pompa e a cerimônia totalmente destituídas de significado, apenas relíquias excêntricas, embora interessantes, de uma era estranhamente desprovida de autocrítica? O salmista diz: “Não temas, quando alguém se enriquecer, quando avultar a glória de sua casa; pois, em morrendo, nada levará consigo, a sua glória não o acompanhará. Ainda que durante a vida ele se tenha lisonjeado, e ainda que o louvem quando faz o bem a si mesmo, irá ter com a geração de seus pais, os quais já não verão a luz. O homem, revestido de honrarias, mas sem entendimento, é, antes, como os animais, que perecem” (Sl 49.17-20). Kipling escreveu: O tumulto e a gritaria se desvanecem, partem o rei e o capitão. Teu antigo sacrifício permanece: um humilde e contrito coração. Em algumas semanas, você estará em casa novamente e nós teremos poucas semanas para conversar sobre seus planos de casamento, para decidir sobre coisas como a lista de convidados, o local da recepção, o menu que você deseja, além de comprar o vestido de noiva. Na biografia de seu pai, você lê as opiniões dele sobre festas de casamento: “As formalidades mais vãs e sem sentido [...] nenhum vestígio de realidade. As testemunhas se vestem para se exibir. A carne reina por toda a parte. Nós, fundamentalistas, somos um bando de gente melosa e que gosta de aparecer. [...] É apenas um enfado dispendioso”. Mas ele escreveu isso quando tinha vinte e um anos. Se ele houvesse vivido mais do que os vinte e oito anos que recebeu, talvez chegasse a entender o significado desse ritual, algo totalmente estranho à sua criação. Você quer um lindo e longo vestido branco, além do véu tradicional. Você quer música, flores e um séquito de atendentes. Não para provar que você é “gente melosa e que gosta de aparecer”. Para nós, sinais e sons, símbolos e movimentos, fazem parte da adoração e da celebração, e você quer que seu casamento seja cheio de sinais visíveis, tangíveis e audíveis do significado invisível e transcendente. Acaso a pompa seria incompatível com a humildade? Você ouviu o que C. S. Lewis disse em seu Preface to Paradise Lost: Acima de tudo, é preciso livrar-se da ideia medonha, fruto de um disseminado complexo de inferioridade, de que a pompa nas ocasiões adequadas tenha qualquer ligação com vaidade ou presunção. Um celebrante aproximando-se do altar, uma princesa sendo conduzida pelo rei para dançar um minueto, um oficial-general em um desfile cerimonial, um mordomo precedendo a cabeça do javali em um festival natalino — todos esses usam roupas incomuns e se movem com calculada dignidade. Isso não significa que sejam vaidosos, e sim que são obedientes; eles obedecem ao hoc age que preside toda solenidade. O hábito moderno de fazer coisas cerimoniais sem cerimônia não é prova de humildade; antes, prova a incapacidade de o transgressor esquecer-se de si mesmo durante o rito e sua prontidão em estragar, para todos os demais, o apropriado prazer do ritual. Parece-me que a aceitação de uma ordem universal molda a imaginação e prepara o terreno para a apreciação da cerimônia. Vemos na ordem terrena um reflexo da celestial. Encontramos nas cerimônias tradicionais a ocasião para nos submetermos às verdades maiores que elas representam. Seu casamento não será apenas uma desculpa para reunir todos os nossos amigos e parentes para “compartilhar a nossa alegria” (como dizem timidamente alguns dos convites de casamento pouco cerimoniosos de hoje em dia) na união entre você e Walt particularmente, mas uma celebração do matrimônio, de uma instituição ordenada por Deus na criação do homem, a qual deve ser iniciada tanto com solenidade como com alegria. A cerimônia fornece a forma, o ritual que (para citar Lewis novamente) “torna os prazeres menos fugidios, [...] que entrega ao sábio poder do costume a tarefa (para a qual o indivíduo e suas variações de ânimo são tão inadequados) de ser festivo ou sóbrio, alegre ou reverente, quando escolhermos sê-lo e não ao acaso





Comentários